Artista: Ana Moura
 
Arte: Fado
 
Idade: 37 anos
 
Concerto: Macedo de Cavaleiros, S. Pedro, 2016
 
 
ENTREVISTA
 
 
Diário de Trás-os-Montes (DTM): Porquê o Fado?
 
Ana Moura (AM): O Fado vem desde pequenina porque os meus pais eram grandes amantes de Fado e cantavam os dois e eu cresci neste ambiente sempre a ouvi-los cantar Fado. O meu pai tocava guitarra e sempre tive este gosto especial pelo Fado, embora tenha descoberto também outros géneros de música. Agora, o carinho especial é pelo Fado. Mas, realmente, desde miúda que as pessoas me diziam “Ana, tu és fadista! Podes cantar tudo, mas a tua alma é de fadista”. Agora, percebo que sim e o que quer que seja que esteja a cantar eu sinto-me fadista em tudo aquilo que canto.
 
 
DTM: O Fado passou a ser multigeracional porque tem outro encanto?
 
AM: Eu acho que é normal o público identificar-se cada vez mais com o Fado porque há gente nova a escrever, as letras refletem muito a nossa identidade, mas refletem a nossa geração. Ou seja, nós já lidamos com os nossos sentimentos de uma forma diferente, embora de uma forma muito caraterística, que é a nossa, portuguesa. Temos o mar, na nossa frente, e a Europa nas nossas costas, e, portanto, temos esse lado nostálgico, de fato. Mas somos um povo bastante emotivo, que tanto vive a alegria com muita intensidade, como vive a tristeza. E isso é-nos caraterístico. E, neste momento, há imensos compositores a descreverem-nos muito bem, há muitos cantores, há músicos extraordinários a tocarem a nossa música belissimamente e que acompanham estes tempos. Por isso, é normal e comum que cada vez pessoas mais jovens se identifiquem com o nosso Fado.
 
 
DTM: O seu último álbum, Moura, lançado em 2015, como é que tem sido recebido pelo público?
 
AM: Muito bem! Nós começámos logo em Paris numa sala emblemática, no Olympia, onde tínhamos imensos portugueses. As pessoas estavam ali para nos apoiar com a bandeira portuguesa e foi mesmo muito bonito. Portanto, temos andado por toda a parte, já fomos aos Estados Unidos, ao México, como temos andado por Portugal agora e, realmente, a recetividade tem sido incrível. Percebe-se logo nos primeiros acordes que as pessoas já conhecem as músicas novas e a aceitação tem sido muito boa. Aliás, em duas semanas atingi logo o Galardão de Platina e isso deixa-nos extremamente felizes.
 
 
DTM: Qual é o segredo para o Fado interpretado por Ana Moura cativar tanto público?
 
AM: Eu acho que o segredo é fazermos aquilo que realmente gostamos. Sermos honestos com nós próprios, independentemente, daquilo que as outras pessoas possam julgar. Acho que isso é muito importante porque o público não é inocente. Ele sente quando a mensagem é passada com verdade e, portanto, eu acho que esse é o principal segredo. Nós sermos fiéis àquilo que nós somos e uma vez que o Fado vive da alma, da expressão da alma e não existem almas iguais, eu acho que isso faz com que o cantor seja único e as pessoas estejam ali, única e exclusivamente, para aceitar tudo aquilo que a pessoa tem para lhes dar.
 
 
DTM: Com sete álbuns gravados em estúdio e mais um gravado ao vivo no Coliseu, o que é que lhe falta alcançar enquanto artista?
 
AM: Há sempre imensas coisas. Nós vamos conhecendo, assistindo a concertos e a arte, em geral, inspira-nos de diversas formas. E, portanto, acaba por nos motivar e fazer com que nós queiramos fazer sempre coisas diferentes. É muito difícil nós prevermos aquilo que queremos fazer daqui a uns anos. Neste momento, eu estou extremamente feliz com aquilo que fiz com este disco e estou a usufruir o momento. O que é muito difícil hoje em dia, pois estamos sempre a pensar no futuro, a viver o futuro ou a lembrar o passado. E, portanto, neste momento, eu estou focada a usufruir do presente e quem sabe o que virá num futuro próximo…
 
 
DTM: Que músicos a inspiram ou tem como referência?
 
AM: Tenho imensos músicos. A minha maior referência no Fado é a Amália Rodrigues, mas a Maria da Fé, a Lucília do Carmo, a Beatriz da Conceição, são assim as minhas referências do Fado. Mas, depois, eu gosto imenso de soulmusic, a música da alma, que tem esta cumplicidade com o Fado, gosto de Etta James, de Nina Simone, Aretha Franklin, Marvin Gaye são vozes que me inspiram, mas depois também gosto de música francesa, aquela mais antiga, oiço também música eletrónica, oiço um bocadinho de tudo, portanto. Gosto de vários géneros de música.
 
 
DTM: O que é que há de Ana Moura nos seus Fados?
 
AM: Há tudo! Porque eu com este disco trago a mensagem de que eu quero resgatar e ideia de que o Fado era dançado no século XIX e isso foi-se perdendo e foi sendo cada vez mais relacionado só única e exclusivamente com a nostalgia. E eu pretendo resgatar essa ideia. Os meus Fados trazem essa alegria, essa vontade de resgatar essa ideia, que o Fado também se pode dançar. Mas também traz o lado mais profundo, mais nostálgico, que faz parte da minha personalidade também.
 
 
DTM: De todos os países que já visitou, qual é aquele que mais se identifica com este sentimento tão nosso, tão português, que é a saudade intrínseca ao Fado?
 
AM: É difícil! Realmente, há países mais próximos na sua identidade da nossa personalidade, mas eu acho que o bonito mesmo das viagens é perceber que culturalmente nós somos muito diferentes. E perceber através da reação do público e é fácil perceber, como é que é a personalidade desse povo, desse país. Eu acho que essa diversidade é que é interessante. O facto de sermos todos diferentes e cada país ter uma personalidade e uma identidade própria.
 
 
DTM: E quando atua para portugueses, o que é que passa da nossa personalidade, enquanto povo, enquanto nação, para si, enquanto artista?
 
AM: Nós somos um povo bastante emotivo. Nós tanto vivemos a alegria com uma intensidade imensa como passados cinco minutos acontece qualquer coisa que nos emociona e lá estamos nós a chorar. Isso é mesmo caraterístico de nós e há uma frase de uma grande figura da poesia do nosso país que é a Agustina Bessa Luís que nos reflete maravilhosamente quando diz que o português não é conflituoso, é desordeiro. Porque o conflito está na mente e a desordem no coração. Portanto, nós vivemos tudo com o coração e por isso é que podemos ser mais desordeiros, mas conflituosos nós não somos. 
 
 
 



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