Em contexto de residência artística, e em pleno Parque da Cidade de Macedo de Cavaleiros, Miguel Neves Oliveira transformará simples troncos de madeira em esculturas durante cinco dias. Para consciencializar as pessoas da “importância essencial dos seres mágicos que são as árvores” e do solo “onde tudo acontece”

Em quatro concelhos e em oito espaços expositivos fixos, mas também a deambular pelo território banhado pela Linha de Água – Bienal de Arte Contemporânea de Trás-os-Montes, em contacto com as comunidades. A 2.ª edição do evento arrancou há uma semana e está na rua. E em sentido literal, já na próxima semana, de 27 (segunda-feira) a 31 (sexta-feira), em pleno Parque da Cidade de Macedo de Cavaleiros.

Em trabalho de campo, em contexto de residência artística – intitulada "Terra-Mãe" -, estará o escultor Miguel Neves Oliveira. Sem segredos, à vista de todos, com o despojamento e o terra-a-terra próprios de quem se habituou a criar arte de forma despretensiosa, como que nascida, amiúde, do cruzamento entre a arte bruta, a land art, o impressionismo e o expressionismo.

“Para valorizar o património natural e cultural desta região, a ideia de base é transformar simples troncos de madeira em esculturas que consciencializem as pessoas da importância essencial dos seres mágicos que são as árvores, que nos alimentam, protegem e que estabelecem uma partilha íntima com os seres vivos e não vivos que as rodeiam. Não podemos falar da vida que habita o planeta Terra sem admitir a fulcral importância do solo, onde tudo acontece”, adianta o artista.

A intervenção quer potenciar a fruição da arte e do próprio processo criativo, claro, mas estimular a troca de laços com os passantes, residentes e turistas, a propósito de aquela que será, afinal de contas, mais uma homenagem a Trás-os-Montes e às suas gentes.

O escultor bracarense - que se vê “espontâneo, mas denso, criativo, porém conservador e, também, profundo” - tem produzido trabalho afincadamente há 20 anos, e exposto individual e coletivamente de norte a sul do país.

Madeira, ferro e pedra são os materiais de eleição de Miguel Neves Oliveira, que se habituou a dar tempo para o ferro oxidar e ganhar “a cor misteriosa que surge da natureza dos materiais”. Bem como as “cicatrizes que resultam de constantes mutações”. Sem surpresa, as árvores, as montanhas, o céu, a terra e o sol são os rebentos que brotam da sua sensibilidade criadora, sob a forma de esculturas.

“É um momento, em muitos, que dá expressão à arte, de uma forma, geral, e à nossa Bienal, em particular, como um momento aglutinador e de interação com os apreciadores. A arte tem essa virtude, de nos fazer parar, refletir, unindo credos, ideologias e convicções”, salienta Benjamim Rodrigues, presidente da Câmara Municipal de Macedo de Cavaleiros.

Até 30 de novembro, o município tem a decorrer no Museu de Arte Sacra, no Centro Cultural, no Welcome Center do Azibo e no Mercado Municipal a 2.ª edição da Bienal de Arte Contemporânea de Trás-os-Montes. Que se distribui ainda pelos concelhos de Alfândega da Fé (no Lagar d`El Rei), Vinhais (no Centro Cultural Solar dos Condes de Vinhais), Freixo de Espada à Cinta (Auditório Municipal).

O acontecimento contemplará também intervenções menos tangíveis para o grande público, de que serão exemplo a formação de professores, a capacitação de mediadores culturais, oficinas em escolas e nos espaços educativos do evento e, ainda, interações de residências artísticas nas comunidades locais, diálogos filosóficos/reflexivos entre especialistas e investigadores, com o intuito de espelhar as identidades e as culturas das diferentes regiões.

Jaime Silva, recorde-se, é o artista homenageado da 2.ª edição da Bienal de Arte Contemporânea de Trás-os-Montes.

Alguns projetos de relevo da Bienal de Arte Contemporânea de Trás-os-Montes - Linha de Água incluem…

• A exposição Arte pelo Território, com curadoria de Ágata Rodrigues, proporá uma abordagem que irá ao encontro da interligação entre o Homem e a Natureza. A exposição não destacará apenas a simbiose entre a natureza e o território de Trás-os-Montes, mas proporcionará uma reflexão profunda sobre essa ligação intrínseca.

• Agarrar a Água, com curadoria de António Meireles, tomará como eixo concetual a valorização da água e das pessoas, e dos modos como lidam com ela, para focar atenção na relação entre artistas e a comunidade das aldeias que circundam a Albufeira do Azibo. As instalações e desenvolver serão expostas nas mesmas aldeias, permitindo que a comunidade tenha um acesso direto às obras para cuja criação foram estímulo;

• Arte Rio Acima, por sua vez, sob a curadoria de Guilherme Fonseca, destacar-se-á como um projeto-linha que procurará construir pontes entre o litoral e o interior. Com três abordagens diferentes na arte contemporânea - ilustração, vitral e têxtil - e uma premissa central de sustentabilidade, o projeto visará seguir o curso da arte, sem sentido definido, mas com todos os sentidos possíveis, assim como as linhas de água que espalharam civilizações;

• Jaime Silva, que celebra 50 anos de carreira, surgirá com uma aproximação aporética à arte contemporânea, com propostas artísticas, que se destacam pela versatilidade, espiritualidade e fragilidade;

• No projeto A Linha e seus Semelhantes, com curadoria de José Manuel Barbosa, a exposição encontrará similitudes na Linha que separa dois planos distintos – o que está fora ou dentro, o que é imediatamente dado a ver ou escondido por um véu translúcido; no entanto, ao invés de separar, ela anuncia-se mutável e inquieta pela própria localização que repousa no espaço e no tempo;

• A bienal estender-se-á, ainda, à Land Art de Miguel Moreira e Silva, utilizando recursos naturais e propondo uma obra efémera que reflete sobre a limpeza florestal e o retorno à terra. A equipa proposta para o desenvolvimento do projeto é notável;

• “Representar a Identidade de um Lugar Transmontano”, de Luís Rodrigues, pretenderá concretizar uma escultura, que será um elemento com o qual os visitantes poderão interagir, aos mesmo tempo em que se aprecia os trabalhos dos diferentes artistas, em simultâneo. Tratar-se-á de uma escultura em forma prismática, feita com acrílicos espelhados, com as faces interiores e as faces exteriores em espelho, perfuradas com círculos – com a função de janela – e que poderá girar num sentido rotativo;

• A curadoria de Natália Fauvrelle, por sua vez, fará a ponte com o artista homenageado da 2.ª edição da Bienal de Arte Contemporânea de Trás-os-Montes, com parte do acervo Museu do Douro, com obras doadas por Jaime Silva;

• O evento trará também O Poder do Objeto, com novos olhares da FBAC – À Liberdade, de Jorge da Costa, num acervo da Fundação de Vila Nova de Cerveira;





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