Quem entra no Museu do Castelo, em Moncorvo, tem de o fazer pela "porta da traição", para assim iniciar uma viagem até ao século XIII, ao início do reinado de Dinis, através do que resta da fortificação medieval.
O novo Museu do Castelo recria um percurso que se inicia na "porta da traição", podendo o visitante percorrer o troço da muralha mandada edificar em 1285, até às fundações das antigas torres e, ao mesmo tempo, ter acesso a informação em vários formatos, essencialmente digitais, que contam toda a história de um castelo que acabou por ser demolido no século XIX.
Ao certo ninguém sabe o significado da "porta da traição" do castelo de Moncorvo, talhada na parede Oeste da muralha do castelo, ladeada a Norte por um nicho. Contudo, os historiadores entendem que poderia ter sido um ponto de fuga, em caso de ataque, ou de entrada de pessoas estranhas, embora existam outras teorias menos dominantes.
Esta viagem histórica, empreendida com a visita ao museu, permite revelar no local o papel original de uma imponente fortificação que fez parte de uma rede de castelos que, durante a Idade Média, ajudou os portugueses a defenderem-se do invasor castelhano.
No seu espaço, ainda são visíveis as fundações das muralhas, estruturas fortificadas e um espólio que foi recolhido ao longos de várias décadas, através de sondagens arqueológicas, composto por objetos que vão de a moedas a artefactos em cobre, cerâmica ou ferro.
A viagem no tempo remonta aos primeiros anos do reinado de D. Dinis (1261-1325), iniciado em 1279, com a construção de duas cercas defensivas ao então burgo medieval onde hoje se situa a vila transmontana de Torre de Moncorvo, no distrito de Bragança, explicou o historiador e investigador Nelson Rebanda, à agência Lusa.
"Toda a história desta fortificação começou com o foral atribuído por D. Dinis, em 1285. A construção do castelo é uma obra pública que teve a sua importância na defesa da fronteira com Espanha, que é considerada a mais antiga da Europa. A construção dos castelos, para além da função defensiva, era sinónimo de dinâmica económica para o interior do país", explicou à Lusa o também investigador da Direção Geral do Património Cultural (DGPC), que esteve envolvido na descoberta das primeiras gravuras do Vale do Côa, no início dos anos de 1990.
Além da conservação e valorização dos vestígios arqueológicos do castelo, imóvel classificado de Interesse Público, pretende-se reforçar o papel do centro urbano como polo aglutinador, criar um conjunto de fatores atrativos em termos turísticos e culturais, incentivar a utilização da zona medieval e promover e divulgar estes achados arqueológicos.
"Muitas destas fortificações medievais, apesar da importância que tiveram na defesa do reino de Portugal, não chegaram aos nossos dias, fruto de diversas transformações dos modelos defensivos das populações. Em consequência das guerras, estas estruturas também acabaram por sucumbir aos estragos provocados pelos invasores. Já no século XIX, fruto de uma mudança de perspetiva, os castelos perderam a sua importância militar e [em muitos casos] viraram pedreiras", vincou Nelson Rebanda.
Segundo o investigador, as pedras do castelo de Moncorvo serviram para construir novos espaços públicos e privados, na região, durante a primeira metade do século XIX.
"Na altura, a Câmara, justificou-se através de uma ata (...). Era intencional estabelecer a ligação entre a parte muralhada, que era mais antiga, e parte mais moderna, e o castelo era um obstáculo que dificultava essa circulação urbanística", recordou Nelson Rebanda.
Com o passar dos anos, o castelo de Moncorvo foi caindo no esquecimento, até que, no início da década de 80 do século XX, começou a ser colocado a descoberto, passando por várias etapas até se chegar a esta unidade museológica que explica o esse percurso de cerca de 700 anos de história da região e, através dela, do país.
Para os visitantes é uma autêntica viagem histórica, leal ao seu tempo, durante a qual conseguem perceber o que foi o antigo castelo da sua terra natal. Foi o caso de Bernardo Silva, como o testemunhou à Lusa.
"Trata-se de um bom investimento [o Museu]. Está muito bem conseguido. Enquanto moncorvenses acabamos por perceber melhor as raízes da nossa história, com uma visita ao Museu do Castelo, desde as primeiras muralhas construídas até a sua expansão. Há um vídeo explicativo que nos ensina a perceber melhor o nosso passado. Vale uma visita", indicou este visitante, que percorria os diversos pontos deste espaço cultural, durante a reportagem da Lusa.
Para a técnica superior de Turismo do município de Torre de Moncorvo, Paula Salema, o Museu do Castelo é mais um elemento de visitação que faz parte de um roteiro histórico da vila e que dá a conhecer as suas mais diversas vertentes históricas e culturais desta vila.
"A abertura deste museu acontece numa fase de desconfinamento, devido à pandemia, e é pretensão do município desenvolver estratégias que promovam o património histórico local, em que se insere este museu, ao lado de mais quatro equipamentos, como o Museu de Arte Sacra, o Núcleo Museológico do Douro Superior, a Casa da Roda e o Museu do Ferro", explicou à Lusa.
Paula Salema sublinha que estes espaços são determinantes numa estratégia para cativar visitantes e dinamizar a economia local.
O espaço museológico do castelo foi aberto ao público em 12 de abril deste ano, data em que se assinalaram os 736 anos do foral outorgado pelo rei Dinis a Torre de Moncorvo.