Alexandre Parafita
Os políticos no buraco de uma agulha
Com o Natal à porta, um tempo de partilha solidária, de maior atenção para os pobres e desfavorecidos, há notícias que chocam ainda mais: as que correm por aí dando conta de uma boa porção de políticos que, lançando mão de direitos adquiridos antes de 2005, estão agora a requerer subvenções vitalícias e subsídios de reintegração ao abandonarem os cargos que vinham desempenhando. Acontece que uns deixam esses cargos e vão, não para o desemprego, mas para as suas anteriores profissões geralmente muito bem remuneradas (por quê então o subsídio de reintegração?), e outros já se encontram aposentados a auferir chorudas pensões (por quê então o subsídio de reintegração? Vão reintegrar-se em quê?).
Este despudor “legítimo” (porque legal) traz-me à lembrança algumas memórias de infância, em que uma das minhas avós, mulher humilde, que fez voto de pobreza logo à nascença (ela e mais um açafate de irmãos…), costumava dizer, decerto a procurar sublimar o desconforto da sua condição, que era tão possível a um rico entrar no céu como um gato entrar no buraco de uma agulha. Por via desta alegoria, dei comigo na infância a imaginar uma interessante hierarquia de céus: o céu dos anjos que ficava por cima das nuvens, para onde iam os pobres; a seguir o céu dos pardais para onde iam os remediados; e por fim esse tal buraco de uma agulha para onde iam os ricos.
E por via destas memórias, apetecia-me às vezes, em épocas de Natal, voltar a ser criança, quando mais não fosse para poder imaginar alguns desses políticos e ex-políticos milionários a sufragarem as suas penas obrigando-se a entrar no buraco do cu… de uma agulha.